segunda-feira, 18 de maio de 2015

Dois tropeções na ternura




É simples a separação.
Adeus.
Desenlaçado o último abraço, uma pressa de dar costas um ao outro.
Já não há gestos. O derradeiro (impossível) seria não desfazer o abraço.
Pressa de cada um retomar o outro na teia lenta da relembrança.
Não desfazer o abraço. Ficar de face encostada ao niagara dos cabelos.
Sobram fotografias, voz no gravador, um bilhete na caixa do correio.
Sobra o telefone.
Tensão-telefone. Possibilidade de voz não póstuma.
No gravador, voz de ontem, de anteontem. De há anos.
Sobra o telefone. Mudo.
Retininte?
Sobrarão cartas. Sobra a espera.
Na teia lenta da relembrança, retomo-te em memória recente: na praia da ternura onde nos enrolámos e desenrolámos desesperados de separação.
Sobra a separação.


[Alexandre O'Neill]

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