domingo, 31 de janeiro de 2016

Se eu falar em tristezas por favor amordaça-me o coração


Porque será que ninguém ri
quando se estatela um cego?

Porquê cal sobre o ventre?
Porquê aí, onde se começa?

Porque será a pornografia
desdita maior que a impotência?

Porque se embriagam
os que derrubam árvores e apanham peixes?

Porque é mais aflitiva a sirene
da ambulância que a sineta do cemitério?

Porque escorrem fios
de lágrimas, antes do abate, os bois?

Porque se alimentam os homens
com a morte, e ela, acertando contas, os devora?

Porque acabam os filhos
por assemelhar-se à pele dos pais?

Porque se volta aos lugares de infância
como um homicida ao local do crime?

Porque há gente que nem compaixão
devia merecer pela sua miséria?
 

[António Osório]

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